A Cidade do Pensamento único; Desmanchando Consensos
Otília Arantes, Carlos Vainer, Ermínia Maricato
Otília Arantes, Carlos Vainer, Ermínia Maricato
O livro
No primeiro estudo, de autoria de Otília Arantes, o leitor
encontrará um quadro histórico do urbanismo depois dos Modernos, especialmente
dos anos 70 ao final do século, período coberto pelo menos por duas gerações
urbanísticas, cuja evolução a autora acompanhará do ângulo mais especifico do
papel desempenhado pela Cultura na produção das cidades ao longo dos últimos
trinta anos. Lida pois com um dos grandes paradoxos ideológicos do nosso tempo,
ou seja: a centralidade da Cultura num processo comandado cada vez mais pelo
Capital. Periodizando este arranjo inédito, Otília Arantes destaca a
convergência objetiva de dois modelos de produção de uma nova configuração
urbana, a cidade-empresa-cultural: um americano e outro europeu (aliás
originalmente parisiense). Mesma convergência involuntária entre as duas
gerações urbanísticas que até então se imaginavam contrapostas, a dos
contextualistas e a dos empreendedores, e uma assimilação a tal ponto integral
que já não é mais possível distinguir dissidentes e integrados. Outra novidade
de época assinalada pela autora, porém, para melhor demonstrar que o atual
"pensamento único" das cidades não é uma fatalidade da hegemonia global.
Tais fatalidades se
fabricam, como mostrará Carlos Vainer nos dois ensaios seguintes. Para o autor,
esta via de mão única que, entre outras designações, também atende pelo nome de
Planejamento Estratégico Urbano, transpõe para o espaço urbano os conceitos e
metodologias do planejamento estratégico empresarial, elaborados originalmente
na Harvard Business School. Do que resulta um projeto de cidade paradoxalmente
articulado por três analogias constitutivas: a cidade é uma mercadoria; é uma
empresa; enfim é uma pátria, entendamos uma marca com a qual devem se
identificar seus usuários, cuja fidelidade ao produto, vendido como civismo,
requer algo como o exercício bonapartista do poder municipal. Nunca se falou
tanto em polis, mas o autor sugere que se chame as coisas pelo nome: City, no
caso. Isso no primeiro estudo. No segundo, Carlos Vainer recapitula a
implantação pioneira do Planejamento Urbano Estratégico na cidade do Rio de
Janeiro.
Ermínia Maricato, por sua
vez, tratará de desmanchar, no último capítulo do livro, o consenso mais
profundo e assustador: um ponto cego recorrente e funcional – ou seja, o futuro
quase nenhum de nossas cidades continuaria atrelado à cláusula pétria do pacto
histórico entre as classes dominantes brasileiras: o caráter intocável da propriedade
do solo. Consenso de todos os consensos à esquerda e à direita, hoje reunidas
pelo glamour gerencialista do urbanismo de resultados, mas cujo principal
resultado continua sendo o crescimento exponencial da cidade ilegal e sua
gigantesca expansão espacial de pobreza, desamparo, e violência. Ao contrário
da tradicional coalizão em que se sustenta o poder conservador no Brasil, a
autora não acredita que este destino seja fatal - salvo para as referidas
elites, esperamos - por isso finaliza seu estudo com algumas propostas
alternativas dissidentes.
Credito: Vitruvius